domingo, 29 de outubro de 2006

Carta nº 1




Carta nº1 – Novembro de 2006



«A Responsabilidade de se ser amado»

Minhas Irmãs e Irmãos,

Quando falamos de amor, na maior parte dos casos, pensamos em amar. E isso está certo. O Amor implica a acção de Amar.
Todos os grandes Mestres da Humanidade, apelaram a essa acção contínua: Amar incondicionalmente, todos os seres, sem distinção de espécies, de condições de existência ou formas de aparição. Dentro da espécie humana, esses mesmos Mestres, também (apenas) apelaram ao Amor incondicional, sem distinção de sexos, de raças, de credos, de condições sociais. Foram seres revolucionários. Alguns deles, perderam, fisicamente, as suas formas de Aparição – a maneira como se nos mostraram – em actos de grande violência, outros tiveram uma Presença Terrena duradoira e profícua, permitindo que os seus ensinamentos fossem dados de forma directa a todos aqueles que se aproximavam.
De boca a ouvido, esses ensinamentos chegaram até hoje. É certo que por vezes de uma forma velada, outras de uma forma objectiva. Umas vezes foram usados símbolos e metáforas para transmitir esses conhecimentos, outras vezes eles foram transmitidos sem ocultações nem véus.
O facto é que esses ensinamentos chegaram aos nossos dias e a essência desses ensinamentos é sempre a mais preciosa trindade da Vida-Una: O AMOR, A COMPAIXÃO, A BONDADE – sem limites, sem objectivos, sem dogma, sem expectativa.
Do meu ponto de vista não há discípulos. O discipulado é invenção separatista do todo, do grande sentido da Vida que tudo engloba, sem passado, sem presente, sem futuro (todas estas palavras implicam conceitos e um pensamento racionalizado, portanto subjectivo) –; com efeito, onde acaba o Mestre e começamos nós? Onde acabamos nós e começa o Mestre? Será possível a alguém determinar essa separação?
Se observarmos, basta sentarmo-nos e observar, tranquilamente, alguém pode ser detentor do Amor, da Compaixão e da Bondade? Parece-me um facto que não. E, assim, nada nos separa do Mestre. O Mestre somos nós e nós somos o Mestre.
Por vício, por medo, por insegurança, por condicionamento puro psicológico, habituamo-nos a ver os nossos Amigos Espirituais como seres «divinizados», seres altamente «realizados» e, com o tempo tornamo-nos completamente dependentes deles. Até porque essa ligação a um Guru, a Lama, a um Prior… um Professor vai sendo efabulada pela nossa mente. Quanto mais consideramos esse Professor alguém profundamente Iluminado, mais sentimos o nosso ego inchar: «Olhem bem! «EU», sou discípulo do Prior tal, do Santo, do Grande Lama, do Magistral Guru. Um passo à frente e até já nos sentimos os seus preferidos, embaixadores da realização espiritual (coisa que na verdade não sabemos o que é) daquilo a que por conveniência chamamos «O nosso Mestre». Isso conforta-nos o ego, dá-nos uma sensação de protecção, de autoridade. Mas o facto é que tudo isso é tão ilusório como confundir «uma corda com uma cobra».
Encaremos o precioso ensinamento do Amor-Amar, da Compaixão-Acção, da Bondade-Coração, com toda a simplicidade, sem subterfúgios, sem nos resguardarmos sob a autoridade de ninguém, seja esse «alguém», Buda, Cristo, um «Mestre» de determinada religião, os nossos pais, Deus, os Anjos, Bodhisatvas… enfim, toda a panóplia se «coisas» que chamamos a esses seres com a arrogância de sabermos do que falamos.
Encaremos estes ensinamentos apenas como um testemunho de alguém amigo, sem imediatamente nos considerarmos discípulos ou o que quer que seja de parecido. Aceitemos de uma vez a responsabilidade de sermos o Mestre de nós mesmos, com todas as consequências disso mesmo.

Por vezes, quando amamos, ou até quando simplesmente sorrimos genuinamente a alguém, despertamos nesse ser uma Luz que jamais se extingue. «Somos responsáveis [os únicos responsáveis] por aqueles que cativamos.» Encontramos esta frase nas páginas de «O Principezinho» Antoine de Saint-Exupéry. E assim é. Amar não é uma «coisa» que nos acontece, dura um tempo e depois se desvanece. Isso não é Amor. Amar é também ser-se Amado. Quando dizemos que deixámos de amar alguém e afastamos esse ser do nosso amplexo, não só estamos a iludir-nos (mais uma vez) quanto àquilo a que chamamos amor, como estamos a impedir que esse ser que cativamos, ame.
Amar uma pessoa, não é diferente de amar o universo inteiro. E amar não é um «mar de rosas». Ou talvez seja. Mas o mar também é dotado de marés vivas e correntes perigosas que é preciso aprender, compassivamente, a integrar a forma natural de o mar «ser». E as rosas, toda a gente sabe isso, têm espinhos. Será que preferiríamos um mar morto e rosas mutantes, sem espinhos, sem aquilo que é a sua natural forma de ser rosa? Para a maioria de nós sim. É um facto que, mesmo inconscientemente, preferiríamos isso. Mas a Vida, felizmente, preserva a sua imensa criatividade e coloca-nos os maiores desafios. Por outo lado, infelizmente, confrontados com esses desafios preferimos desistir, tornarmo-nos irresponsáveis perante o facto de sermos amados, e ao sermos amados esse ser (ou seres) estar a amar todo o universo.
Honrar o compromisso do coração de amar e ser amado é uma imensa responsabilidade. Podemos não a querer assumir. Somos absolutamente livres para decidir. Mas não nos iludamos dizendo que «amámos». Isso é um artificio psicológico para permitir a nossa fuga à responsabilidade de amar e deixar amar. O Amor não acaba. Não cessa. Observemos com o cuidado de quem trata de um bebé recém-nascido, aquilo que se passa connosco quando declaramos já não amar alguém. No mínimo, em breve, estaremos a tornar-nos fantasmas a penar numa procura sem fim, quando envés de procurarmos podemos encontrar, todo o amor do cosmo, à nossa frente. O Amor-Pleno sempre esteve à nossa frente pronto para ser encontrado.
Para isso, para esse amor incondicional, não precisamos de «condições especiais», Mestres, Professores, Instituições, Religiões, Negações, Afirmações. A vida espera-nos plena desse Amor. Por favor não o procurem. Não se tornem fantasmas. Encontrem-no e sejam responsáveis por ele. Isso acontecerá, instantaneamente. AQUI-AGORA. Se nos sentarmos, respirarmos e pararmos a praga, que aceitámos como verdade, de que a vida é uma demanda reparamos que Graal sempre esteve ao alcance das nossas mãos. O Graal encontra-se, mas jamais se procura. Nós já somos esse ser amoroso e compassivo e bondoso. Assim amemos. Assim nos deixemos amar. Sem juízos. Sem concepções. E estaremos a amar e deixar a amar, a vida. E não há senão Vida.


Konchok Thinley
(Padre Frederico Mira George)

Cartas «Mosteiro Branco»

Prezados Irmãos e Irmãs,
Aqui está a primeira carta da «COMUNIDADE DE ENCONTRO ECUMÉNICO "MOSTEIRO BRANCO"».
Se desejar receber esta carta em papel, por favor indique-nos o endereço para o qual a devemos enviar.
O conteúdo destas cartas estão abertas à participação de todos os que assim o desejarem. Independentemente dos pontos de vista apresentados.
Todas as cartas são da responsabilidade dos seus autores e não reflectem uma opinião oficial da «Comunidade». Coisa que aliás não tem sobre nenhum assunto.
A expressão é livre, tal como os assuntos que nelas serão tratados não obrigam a nenhuma linha de conteúdo.

Fraternalmente,
Konchok Thinley
(Pde. Frederico Mira George.'.)