sábado, 25 de novembro de 2006

Carta nº 2



Carta nº2


É um facto que temos as nossas mentes formatadas, ou pela acção impulsiva, ou pelo extremo oposto, a repressão absoluta das nossas emoções.
Vivemos como se estivéssemos ligados a um controlo remoto – entalados entre a atracção e a repulsa.
Agindo desta maneira, é comum vivermos, como consequência, dois tipos de comportamento: ou o sentimento de culpa ou a rápida auto-desresponsabilização, inventando rapidamente qualquer justificação.
E, assim, as nossas vidas vão avançando no tempo, entre a culpa e a desresponsabilização.
Lentamente vamos ficando marcados pelo sofrimento que infligindo a nós mesmos e aos outros (porque também o sofrimento que infligimos aos outros nos marca indelevelmente).
Afundamo-nos neste mar de ilusões à procura sabe-se lá do quê, andando aos círculos, como os cães, a tentar agarrar a cauda. A mente egocêntrica é capaz de arranjar, sempre, argumentos culpabilizantes ou desculpabilizantes para todas as nossas acções.
Dependendo daquilo a que convencionámos chamar «personalidade», ou nos deleitamos com a culpa (a vitimização é um dos mais fortes estimulantes do ego), ou nos descartamos das consequências das nossas acções, como quem deita lixo num contentor.
Em determinadas alturas da vida, somos capazes de fabricar, convictos, os mais coloridos argumentos sobre o que queremos e não queremos das nossas vidas. Quem nos ouvisse ficaria espantado com a nossa lucidez e capacidade para tomar as mais importantes e «justas» decisões. Passado algum tempo, movidos pela acção impulsiva – atracção/repulsa – ou pela acção repressiva, agimos da forma exactamente ao contrário daquilo que afirmávamos com tanta convicção pouco tempo antes.

Se esta forma de viver nos trouxesse uma felicidade (pelo menos um bem-estar) duradoura, pois bem, nada de errado haveria com esta forma de proceder no nosso quotidiano. A questão é que esta forma vida nos traz sempre resultados devastadores. Principalmente porque se vai degradando a semente de uma verdadeira liberdade (e paz) interior.
No fundo tudo isto é muito semelhante ao consumo de drogas. O problema não está na droga em si, mas no facto de que o seu efeito, apesar de poder ser agradável, não é duradouro e não nos conduz a lado nenhum que não seja à degradação progressiva. O efeito da droga passa e cá estamos, no mesmo lugar, com os mesmos problemas e sofrimentos, mas cada vez mais descontrolados e infelizes numa roda de desgaste e infelicidade.
Nada nos fará sair deste «círculo de feras» enquanto não soubermos controlar a nossa mente envés de ser controlados por ela. Enquanto não formos capazes de controlar o impulso descontrolado (atracão/repulsa) e a repressão cega dos nossos potenciais.
Quando esse estado de calma mental acontece uma paz inesperada faz desabrochar a flor do amor pleno dentro de nós. Amor esse que não se procura mas se encontra se soubermos estar atentos aos sinais da sua presença, sensíveis, disponíveis e despertos ao que nos rodeia.
Para isso é essencial parar o movimento ruidoso da mente. Parar o ciclo vicioso do quotidiano das ilusões. Parar a impulsividade ou a repressão.
Estar sentado, nem que seja por uns minutos, e deixar a nossa mente descansar – tornar a nossa mente «não-mente», todo o sentido da nossa vida se altera instantaneamente, invadidos por uma clara visão do universo, sem conceitos, passando a habitar (pode até ser por um segundo) a plenitude de um vazio pacificador que engloba todos os seres.
Passámos tantas vidas a experimentar o ruído, a «mente-ego». Porque não experimentar agora esta possibilidade de libertação?

K.T.

domingo, 12 de novembro de 2006

Sobre o «Sutra do Coração»

«O Vazio é a Forma
A Forma não é diferente do Vazio
O Vazio não é diferente da Forma.
Do mesmo modo as sensações, as percepções
e as formações mentais e a consciência
são Vazias.»



Meu pobre corpo! Já Platão te reconhecia como a «um mau companheiro» pois que, por causa das suas necessidades, o Espírito é impedido de se aplicar na busca do verdadeiro conhecimento.
Meu irmão corpo, como dizia o «Pobrezinho de Assis» ao pedir perdão de tão mal ter tratado o seu.
Meu irmão corpo onde estão os meus olhos, os meus ouvidos, o meu cérebro. És o invólucro do meu Espírito, da minha consciência.
Meu irmão corpo: Eu te agradeço o indispensável conhecimento sensível que me adapta à vida e que me dá bases para escalar a montanha escarpada que leva ao inteligível.
Não é por orgulho mas sim por necessidade de espírito que empreendi e persisto na subida. Nem sei há quantos séculos.
«O Vazio é a Forma
A Forma não é diferente do vazio...
Os fenómenos são vacuidade. Não têm características, nem origem, nem fim...»
Pretendo visualizar a Vacuidade mas ao fazê-lo sinto-me estonteada como que, presa de longa vertigem, esteja a cair num precipício branco de nevoeiro. Mas a Vacuidade não pode ser nunca forma. Ela é a Forma Absoluta a quem chamamos Deus, que tudo contém em si. A própria Vacuidade está cheia Dele. Logo não existe.
O Homem procura com avidez e sofrimento chegar ao Conhecimento Transcendente a que só terá acesso quando, despojando-se de si, chegar a Deus.
Sinto-me um mísero átomo desgarrado. Estou cansada, e estou tão longe!
Deus, ó Deus! Aconchega-me numa prega do teu manto!

Irmã Maria Olga Afonso dos Reis
9 de Novembro de 2006

terça-feira, 7 de novembro de 2006

Meditação Yogui - Annie Besant








Meditação Yogui
Tradução do Sânscrito para Inglês: Annie Besant

IIª Presidente Internacional da Sociedade Teosófica

«Eu não sou o meu corpo,
Eu não sou os meus sentimentos,
Eu não sou o meu pensamento,
Contudo, sou mais radiante que o Sol,
Mais puro que a neve,
Mais rarefeito que o éter.
Eu, o Espírito que vive no meu coração.
Esse “Eu” sou eu.
Eu sou esse “Eu”.
Eu sou o que sou.»

domingo, 5 de novembro de 2006

«Sutra do Coração»



ESSÊNCIA DO VITORIOSO CONHECIMENTO TRANSCENDENTE
(Bhagavati-prajñaparamita-hridaya)
«SUTRA DO CORAÇÃO»
(Tradução para português: UNIÃO BUDISTA PORTUGUESA)


Assim escutei eu:

Um dia o Bagawat, que se encontrava em Rajguir, sobre a colina dos abutres, em companhia da grande Comunidade dos monjes e da grande Comunidade de Bodhisattvas, entrou no samadi chamado «Percepção Profunda», que examina a fundo todos os fenómenos.
No mesmo momento, o sublime Bodhisattva Avalokiteshvara (Chenrezi), em estado de absorção no Conhecimento Transcendente, viu que a natureza dos cinco agregados era vazia.
Depois, pelo poder do Buda, o Venerável Shariputra perguntou ao bodhisattva mahasattva Avalokiteshvara:
«Como podem exercitar-se os homens e as mulheres afortunados que desejem realizar o profundo Conhecimento Transcendente?» Assim falou ele.
Então o bodhisattva mahasatva Avalokiteshvara respondeu ao Venerável Shariputra:
«Shariputra, aquele ou aquela que quer dedicar-se à prática do profundo Conhecimento Transcendente deve ver assim:
O VAZIO É A FORMA
A FORMA NÃO É DIFERENTE DO VAZIO
O VAZIO NÃO É DIFERENTE DA FORMA.
Do mesmo modo as SENSAÇÕES, as PERCEPÇÕES, as FORMAÇÕES MENTAIS e a CONSCIÊNCIA SÃO VAZIAS.
Assim, Shariputra, todos os fenómenos são VACUIDADE. Não têm características, nem origem, nem fim.
São sem impureza, livres de toda a impureza. Não aumentam nem diminuem.
Eis porque no seio da VACUIDADE não há nem forma, nem sensação, nem percepção, nem formação mental, nem consciência.
Não há olho, nem orelha, nem nariz, nem língua, nem corpo, nem espírito; não há nem forma, nem som, nem odor, nem sabor, nem contacto, nem fenómeno mental. Não há qualidades inerentes à visão, ao ouvido, ao gosto, ao tocar, ao mental e à consciência mental.
Não há nem ignorância, nem velhice, nem morte, nem a sua cessação respectiva.
Do mesmo modo, não há nem sofrimento, nem origem do sofrimento, nem extinção do sofrimento, nem via. Não há sabedoria, nem realização, nem não-realização.
Assim, Shariputra, pois que para os bodhisattvas não há nada a atingir, estes apoiam-se no Conhecimento Transcendente e nele permanecem. Com o espírito desprovido de todo o véu, eles são impávidos. Transcendem toda a visão errónea e passaram definitivamente além do sofrimento.
É apoiando-se no Conhecimento Transcendente que todos os Budas do passado, do presente e do futuro alcançam a budeidade absoluta, o Despertar perfeito e insuperável.
É por isso que o mantra do Conhecimento Transcendente, o mantra da grande clarividência, o mantra insuperável, o mantra inigualável, o mantra que alivia totalmente de todo o sofrimento não mente; sabei que ele é verdadeiro. Eis pois o mantra da Pefeição Trancendente:

TÉYATA – GATÉ GATÉ PARAGATÉ PARASAMGATÉ BODHI SOHA

Shariputra, é assim que um grande bodhisattva deve exercitar-se no profundo Conhecimento Trancendente.»
Em seguida, o Bhagawat emergiu do seu samadhi e felicitou o bodhisattva mahasattva Avalokiteshvara:
«Excelente! Excelente!
Nobre Filho! É isso! É isso!
O profundo Conhecimento transcendente deve ser praticado como tu o acabas de o dizer, e os Tathagatas regozijar-se-ão».
Depois de o Bhagawat ter assim falado, o Venerável Shariputra, o bodhisattva Avalokiteshvara, todos aqueles que os rodeavam e o mundo com os deuses, os humanos, os semideuses e os gandharvas regozijaram-se e louvaram sinceramente as Suas Palavras.

Aqui se conclui a sublime Essência do Conhecimento Trancendente.


Se queres pôr em prática este Sutra, visualizai diante de vós, no céu, o Tathagata no gesto de subjugação das forças negativas, rodeado por Avalokiteshvara e Shariputra que se interrogam e da Sangha do grande e do pequeno Veículo. Recitai tantas vezes quantas puderdes – no mínimo sete – este profundo Sutra e o mantra, contemplando o sentido da vacuidade.


No fim, para repelir as forças negativas, recitai isto:

«Eu presto homenagem ao Buda;
Eu presto homenagem ao Dharma;
Eu presto homenagem à Sangha;
Eu presto homenagem ao Conhecimento Transcendente, a sublime Mãe;
Que todas as minhas palavras de verdade se cumpram!
Como Indra, o rei dos deuses que outrora, contemplando o sentido profundo da Prajñaparamita e recitando-lhe as palavras, repeliu todas as forças negativas e as circunstâncias adversas, possa eu próprio contemplar o sentido profundo do Conhecimento Transcendente, a sublime Mãe, recitar-lhe as palavras e assim repelir todas as forças negativas e as circunstâncias desfavoráveis!
Que elas sejam aniquiladas!
Que elas sejam pacificadas!
Que elas sejam totalmente pacificadas!»

Para terminar, dizei ainda isto:

«Homenagem àquele que mostra que o que surge em interdependência não nasce nem cessa, nem é eterno nem nada, não vai nem vem, não é um nem múltiplo.
Homenagem àquele que dissipa estes conceitos, Àquele que é o perfeito Buda, O mais sublime entre os homens.

De seguida recitai orações de dedicatória e de bons votos.